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Alguns poemas do livro PALAVRÓRIO - Tchello d'Barros

Alguns poemas do livro PALAVRÓRIO
(1996 - Ed. do autor - SC)

 

Tchello d'Barros

 

 

 

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POR AMAR UM AMOR-MOR

 

Mais amor e amar a musa

Ardor de adorar a diva

Num arder louvar a deusa

 

Um cio de concupiscência

Licenciosa orgia

E lúbrica simbiose

 

Aceso amor de libido

Casta paixão na lascívia

E desejos em volúpia

 

Afrodite ou deusa Vênus

Adeus aos erros de Eros

E com camisa-de-vênus

 

 

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DE PERFUMES E PERFÍDIAS

 

Olores de sândalo

Perfumes na brisa

Marulho de ondas

Pegadas na praia

 

No calor da tarde

Ao sol tropical

Dilatam pupilas

Acendem desejos

 

Um úmido vento

Vem todo aromas

Num cheiro de flores

De pétalas doces

  

Na tarde que arde

A sutil fragrância

Hoje denuncia

Um rosto ausente

 

 

 

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SUBLIME SEMBLANTE

 

Nesse sublime semblante 
Um breve tremor no corpo    
Acende a luz das fagulhas
Que ardem por toda a pele
 
Íris além do arco-íris

Encontrar um rosto amado
Nessas fugidias nuvens 
Na tarde um poente de ouro

  
E nos olhos do semblante
Duas mandalas fugazes
Duas gotas do oceano
Ilhas de uma saudade


Um corpo quente e lânguido
Em esguia silhueta     
Tépidas dunas sem fim
Romã de raros aromas


E ferve um rio caudaloso
E queima o leito nas veias
Águas que ardem por dentro
Nas torrentes do desejo

No encontro da pele afago
Toque na pele e carícia
Onde arde a chama o afeto
Semblante em doce ternura
 
As nuvens levam um rosto
As horas levam um nome 
Mas não levam essas letras

Nem essa pedra no peito

 

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NA PONTA DO LÁPIS

 

Papel virginal

De cálido rosto

E nívea brancura

Recebe a visita

De um tímido lápis

 

A mina desliza

Percorre a folha

Nos traços que nascem

E fixa o grafite

Num gesto infinito

 

Nas linhas que surgem

Dos riscos e letras

No branco papel

Emergem desenhos

E versos diversos

 

Os traços do lápis

Percorrem a folha

Não mudam a vida

Não curam o mundo

Nem salvam o homem

 

Mas este grafite

Com poucos rabiscos

Desenha um corpo

Revela um rosto

E escreve teu nome

 

 

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PERGUNTAS PRA LUA

 

A lua de prata

Rainha das nuvens

Refulge no alto

Um disco que lembra

Olhar de pantera

 

No meio da noite

Perguntam pra lua

_Realizar sonhos?

Ela é só silêncio

A não dizer nada

 

Ainda mais silente

Ouve outra pergunta

_Aonde o amor?

Também dessa vez

Nenhuma resposta

 

O halo lunar

Ouve outra vez

_Existe destino?

Calada na noite

Nenhuma palavra

 

Silêncio de prata

Que vive no céu

Envia um sinal

Foi só uma nuvem

Ou a lua piscou?

 

 

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EM SI NUA EM CIO

 

Tudo no lugar

Lascívia no tato

Desejo no olfato

Libido no olhar

 

Sem nada alterar

Encontro de olhos

No suor dos corpos

Ardor e adorar

 

Nada vai mudar

Os que se atraem

Nem os que traem

No ato de amar

 

Nem eliminar

Cupidez no cio

No calor ou frio

Amar e sonhar

 

 

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VISITANTE INESPERADA

 

Num sonho ela aparece

Meia-noite e meia-lua

Uma imagem que oferece

Um corpo de pele nua

 

Mostra agora sua face

Rosto de musa calada

Uns olhos que dizem tudo

Sem dizer uma palavra

 

Essa diva de outro mundo

Bela dona que me encanta

Enche de luz o meu ser

Ao dar-me um beijo de santa

 

Um silêncio mais profundo

Já em plena alvorada

A mulher de pele despida

Me chama ao mundo dos vivos

 

 

 

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O PÓ DO POEMA

 

O pó do poema

É barros e lama

 

Havendo um tema

Não tema nem trema

 

À venda um anátema

Nem treme a trama

 

Valendo uma teima

Há lá quem se queima 

 

Vá lendo o poema

De ameno tema

 

E além de um lema

Há lenda e dilema

 

 

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UMA ALMA MAL ARMADA

 

Quanto cabe no poema

Por vezes agita a alma

Talvez um gume de arma

Quase sempre tão serena

 

E nas letras do poema 

O fio de uma lâmina

A fatiar as palavras

Numa tarefa amena

 

E na escrita do poema

Pena e letal espada

O gume divide um tema

Dúvida em todo dilema

 

E os versos do poema

Neste vale de milagres

Quase tudo vale apenas

Se a arma não é pequena

 

 

 

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TORRE DE PAPEL

 

Arar a palavra

Unir caracteres

No branco papel

 

Lavrar a palavra

Tecendo o idioma

Da torre Babel

 

A rara palavra

Na face da página

Qual rosto sem véu

 

Atar a palavra

Na torre escrita

Que sobe ao céu

 

 

 

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CONVERSÃO COM FÉ

 

Conversa com versos

Ser um réu com fé

Poema processo

 

Sem corpo delito

Nem corpo deleite

Ou corpo de letra

 

Ser um réu confesso

Receber em versos

Um mau veredito

 

No jogo das letras

Nem joio nem trigo

Apenas um grito 

 

Apenas a pena

Para além do rito

Que segue inaudito

 

 

 

 

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ALA DA PALAVRA ALADA

 

Vai palavra voa ao longe 

Além de nossos destinos

Muito além dos horizontes   

E dos nossos desatinos 
 

Leva teu canto ao mundo
E ao voar nos quatro cantos
Deixa no peito dos homens 
Letras do fogo da vida
                             

Poema essa ave branca
Leva as asas do desejo 

Leva segredos e sonhos

De quem ama ao dar um beijo 

Pássaro feito de versos
Sobrevoa esta cidade
Paira nos olhos do homem
Pousa no seio da verdade


 

 

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AS PEGADAS APAGADAS

 

Dançam nuvens lá no céu

Voa longe passarinho

Vai pro alto voa ao léu

Qual poema no papel

Escrevendo seu caminho

 

Em teu voo a leveza

Muito além deste escrito

No teu pouso uma certeza

Teu voar é a beleza

Que procura o infinito

 

Ave rara iluminada

Voa ao sol ou lua cheia

Essa vida é um nada

Será em breve apagada

Qual pegadas na areia

 

 

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100 MEIAS PALAVRAS

 

Com três paus se faz uma canoa

Com três pessoas se tem uma igreja

Com três palavras se faz um poema

 

Com dois paus já se faz uma cruz

Com duas pessoas já se tem ambos

Com duas palavras há uma cruzada

 

Com um pau se arma uma barraca

Com uma pessoa se tem alguém

Com uma palavra se arma a matraca

 

Com meio pau já se tem um poste

Com meia pessoa se tem aquém

Com meia palavra besta basta

 

 

 

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HÁ RISO E HÁ RISCO

 

Nos traços que risco

Meu cisma na reza

Desenha-se misto

 

A vida em rio raso

Desdenha-se um riso

Não piscar o cisco

 

Ser menos que isso

Um mero arabesco

Não mais que um rabisco

 

 

 

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COR EM TOM-SUR-TOM

 

O branco no breu

No verde um tom frio

Suave matiz

E cálida tez

 

Em crua nuance

A plasmar a cor

Somar-se num tom

Sumir-se no breu

 

Degradê do céu

Boreal o azul

Volátil anil

Volúvel na luz

 

 

 

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TANTAS TINTAS VISTAS JUNTAS

 

Na cor nascer ou não ser

No traço que se revela

Na forma que se desvela

Nos limites do espaço

 

Na cor ser ou renascer

Cobrir a tela de tinta

Na mão o pincel que pinta

E um olho aquém de Picasso

 

Na cor a obra a fazer

Preparar toda a tintura

Plasmar na tela a pintura

Matiz nuance e traço

 

 

E na cor acontecer

Gesto onde nasce a obra

Na vida que se renova

Todo dia a cada passo

 

 

 

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QUANDO ANDO REZANDO

 

Se ano após ano

Eu meço essa sina

Que peço na reza

E somo ao meu sonho

 

Se assim me assino

Me assumo insano

Se sigo insone

Nem me assombro

 

Pois ano após ano

Me somo rezando

Me uno andando

Se ando e me sumo

 

 

 

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SÓ DÁ DÓ DE SI

 

Acordar sem sono

Numa corda bamba

Ser na corda um nó

 

Acordar em sina

Numa cor de sonho

Sem ser mais que pó

 

Acordar insano

Num acorde o tom

Dura nota dó

 

Acordar insone   

Som de nota pura 

A dor de ser só

 

 

 

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NA IDA E NA VOLTA

 

Viver é fatal

Passar pela vida

É só um ir e vir

Entre o bem e o mal

 

Ao fim da viagem

Depois desse corpo

Ser alma ser anjo

Ou uma miragem

 

Ainda um mistério

Pra onde se vai

Algum paraíso

Algum céu etéreo

 

 

 

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VIAGEM RÁPIDA

 

Vida é viagem

E há uma alma

Pedindo passagem

 

No trilho ou na margem

Por dentro dos olhos

Tanta paisagem

 

Andar sem destinos

Percorrer caminhos

Correr cem destinos

 

No trem coletivo

De vagão lotado

Viver sem motivo

 

Via obrigatória

Última estação

Dessa trajetória

 

No ciclo do ser

Final da odisséia

Hora de descer

 

 

 

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UMA ALMA LEVADA

 

Cósmico universo

Sideral espaço

E um buraco-negro

 

No vácuo um voo

Que leva na aura

A luz das estrelas

 

Um anjo caído

Elevada alma

De asa lesada

 

Em seu voo cego

De asa tão alva

E alma lavada

 

Elevado karma

No ouro do sol

Um canto de Fênix

 

 

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EXISTENCIALÍSSIMO

 

Do brevíssimo existir

Alguém diz que é deleite

Rico jardim de delícias

O fruir de um banquete

 

Do efêmero existir

Outrem diz ser um martírio

Uma perene angústia

Um contínuo delírio

 

No transitório existir

Ninguém nos diz o que somos

Por que será que vivemos

E nem mesmo aonde vamos

 

 

 

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TEARES E ARTES

 

Tece a máquina na fábrica

E fabrica em desatino

Esse homem que maquina

A sina de seu destino

 

Essa sina se costura

Na malha em lida diária

Estampa a tinta na carne

Em vivas cores douradas

 

Turnos e ritmos contínuos

Os homens a labutar

Urdem o verbo na trama

Em sua luta ao tear

 

Essas vidas por um fio

Tecem linho e algodão

Tudo tecem nada pedem

Porém sempre algo dão

 

 

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A MÁSCARA NO TEATRO

 

Atrás do enigma no rosto
Na máscara de teatro
As pupilas se dilatam
Nos olhos que se escondem

 

Voz que ecoa no teatro
Boca a jorrar palavras 
No palco um ato e um pacto
Acende um desejo o gesto

 

Néctar da boca de Baco
Hálito doce de vinho
E um vulto livre que dança

Que canta o sopro das musas

 

Transe de um corpo na cena

Por fim desce a cortina

A máscara cai do rosto

E o rosto é outra máscara

 

 

 

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ALJAVA DE QUIRON

 

Quiron o centauro

Escolhe uma flecha

E aponta a seta

Os céus se agitaram

 

E qualquer estrela

Se torna um alvo

Pois sabe que a seta

Acerta o destino

 

Todo o universo

A lua as estrelas

O sol e os cometas

Anéis de saturno

 

Todos os que vivem

Lá em cima no céu

Acendem as luzes

Ao voo da seta

 

 

 

 

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AS CAPIVARAS NO AÇU

 

As várias capivaras  

Ciciam seu cio no açu

 

Acima das cismas do homem

Sem medo inculpes copulam

 

Sob a luz do azul do céu

Pastam na relva felizes

 

Dormem seu sono dos justos 

Sonham alheias ao mundo

   

 

 

 

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O CÉU ACIMA DO AÇU

 

Nimbus acima do rio

Dançam na manhã do verão

E desenham sua sombra

Sobre o rosto da cidade

 

Cantam as águas no açu

Imitando a cor das nuvens

E os gerânios violetas

Exalam pólem no ar 

 

E o amanhã sinuoso

Tão incerto e inefável

Como a cor dessas águas

Águas calmas e profundas 

 

Seguem apenas seu curso

Cujas margens onduladas

Encontram no horizonte

O beijo azul do céu

 

 

 

 

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MERCÚRIO COM ENXOFRE

 

No crisol e na crisálida

Ou em crise existencial

A vida segue seu ritmo

Repete o seu ritual

 

Transmutar ouro em chumbo

Na pedra filosofal

Receber a luz dos astros

E o fogo sobre o metal

 

Da treva é que nasce a luz

E da noite surge o dia

Na alma nasce a obra

Da arte nasce a magia

 

 

 

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PARAQUEDAS PARA QUÊ?

 

O céu nesse salto

Um risco no azul

E um sol sob o sul

Ao léu lá no alto

 

Acima da nuvem

Na bruma do vento

Num voo o alento

As asas se curvam

 

Acima do monte

O mundo a girar

Por todos os lados

Linhas do horizonte

 

O voo se finda

Apesar de breve

A alma é tão leve

Que voa ainda

 

 

 

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DE INTENTOS E INSTINTOS

 

Na memória o intento

E na noite o instinto
Esquecer já é distante 
Tanto quanto este instante

 
A lua cheia transborda 
Noite alta e madrugada
Nos meandros de um idílio
Um sino retine ao longe


Na noite um corpo no leito

No leito o sonho no sono 
No sonho o medo da morte

Na morte o fim da viagem

 

Na viagem rir da vida

Na vida o caminho da arte

Na arte a fagulha da alma

Na alma o sentido de tudo

 

 

 

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LINHAS DA PALMA DA MÃO

 

Ardem perenes eternas 

As tempestades solares

Na fuga dos cometas

O êxtase da divindade

 

No alto acima das nuvens

Estrelas iridescentes
Em longínquos quadrantes 
Ao redor da esfera azul

 

Oscilam tantas galáxias
Sutis miasmas etéreos
Pulsares de luzes distantes

Asteróides solitários

 

Na linha azul do horizonte
Fulgem raios rugem rios
No céu rutilam estrelas 

Luzindo sóis e quasares

 

Nas linhas rubras da palma 
As cálidas labaredas
Queimam rubras e voláteis 
Ígnea sina e desdita

 

O destino arde na palma
Sinuosos os caminhos

E o sangue sob a pele

Percorre suas veredas

 

 

 

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AGOSTO À CONTRA-GOSTO

 

O tempo nos tece uma veste

E muito custa esse imposto

E lento nos dá outro susto

Gastou-se mais um agosto

 

Posto que vasto é o tempo 

E visto que nos é imposto

Viver só um tempo sucinto

Numa sina à contra-gosto

 

A teia insana das horas  

Aos poucos sela um desgosto

No vasto espaço do espelho

O tempo esculpe seu rosto

 

 

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PARADOXO DIGITAL

 

Hoje ninguém mais duvida

Dessa ávida ciência

Visceral transcendência

A sentenciar a vida

 

Somos povos hodiernos

A pagar tanto equívoco

Rumo ao inevitável

Ser andróide pós-moderno

 

Da árvore desceu a fera

Mutação evolutiva

Já homem subiu ao cosmos

Urbanóide em nova era

 

Nova ira e novo alento

Ser da causa seu efeito

Nessa mera vil ciência

Crepúsculo de um tempo

 

E veloz se aproxima

Essa era do silício

Ainda nem esquecemos

Da rosa de Hiroshima

 

Neurônio elemental

Entre luzes de sinapses

Emana no paradigma  

Mantra e tantra ancestral

 

Paradoxo digital

Gerando chips e kbytes

Sem espaço pra haicais

Ficção existencial

 

Num sambaqui nuclear

Sarcófago virtual

Um holograma rupestre

Não poderá deletar

 

Do arco a mira no alvo

Ou na corda o som da lira

O sangue vivo na veia 

Nem na musa o sopro em verso

 

Nem no cosmos a viagem

Ou de um mapa o seu rumo 

Da asa o voo de um anjo

O sonho no olho do homem

 

 

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ASTROLÁBIO ON-LINE

 

Um fugaz desígnio
Traduz cartas náuticas
Lúdica odisséia

 

Em vorazes insígnias

Em mapas e bússulas
Fronteiras e mares

 

Nos rumos do mundo

Noutros horizontes

Achar a si mesmo

 

 

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ODE AOS ESCRIBAS

 

Labuta o escriba
Nas vozes antigas

Símbolos e signos


Talha uma epopéia
E veste de letras
Papiros e tábuas

 

E nomes de homens
Destinos do mundo

Nas sendas do tempo

 

 

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PLÊIADES DISTANTES

 

Um risco na noite
Refulge o cometa

Celeste miríade
 
Os anjos e santos

Também eles amam
Estrelas cadentes

 

Viaja no espaço

A luz solitária

Num adeus a Deus

 

 

 

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FÚCSIA O VORTEX

 

Negra pedra ônix
Alta madrugada  

Rutila um quasar

Num vortex volátil 
Reluz em relâmpago
Um
raio magenta

 

Ao final da noite

Centelhas de fogo
Tramando a aurora

 

 

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SETAS DE CENTAUROS

 

Som de tempestades
Na constelação

No céu do zodíaco

 
Nem chuva nem raios

Sequer meteoros

Ou lunar eclipse

 

Apenas centauros

Entre os horizontes
Alvejando estrelas

 

 

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SÍNTESE E ANTÍTESE

 

O futuro não se atina

Morrer é apenas um mito

Diz o ditado sucinto

 

Pois viver nunca termina

É caminhar pelo infinito

Por dentro de um labirinto

 

E cada qual se imagina

Atendendo o quesito

De jamais estar extinto

 

 

 

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FOGO DE OLHO-FÁTUO

 

Crepita sutil
A chama volátil

Em fogo volúvel


Lilás violeta

Labareda tênue

Espalha centelhas


De efêmero lume
A dança das chamas
De luz inflamável

 

 

 

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SIGNOS E DESÍGNIOS

 

Na noite diáfana
Inflama-se a chama
Na cor do crepúsculo

 

Um cálido fogo 
De tépido lume

E luz crepitante

             

Dormita em segredo
Um
sonho inefável

Profecia e fé

 

 

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ZEN IDEOGRAMA

 

Volutas de incenso
Ecoa um koan 
Ao sol do oriente


Nanquim cor da noite 

Desliza o pincel

Pelo ideograma


Cintila um metal

Ao lume da lâmina
Sonha o samurai 

 

 

 

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ELEGIA EM MI  


Lençóis nacarados

Um ar de jasmim

Penumbra diáfana

 

Um sax soa ao longe

E um vinho merlot

Acorda a língua

 

A noite revela

Vorazes sentidos

E dois sóis se encontram

 

 

 

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OLHAR SIMULTÂNEO

 

Impar dorme o par

Sonha um com o outro

No sonho feérico

 

Calor de carbono

Por dentro da carne
Desata-se um frêmito


Voltar da viagem

E ao mesmo tempo

Abrem-se os olhos            

 

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A VERDADE NA CAVERNA

Pedrinhas friccionadas
Pelas mãos de um caçador
Labaredas inflamadas

A parede da caverna
Mostra a luta pela vida
Sempre frágil mas eterna

Viva pintura rupestre
Primitiva arte mágica
Antiga vida terrestre

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CANDENTE ESTRELA CADENTE

Um olho no telescópio
Vê na forma da galáxia
Pétalas da flor de lótus

Passa a estrela cadente
Sua luz aclara o céu
E uma alma descrente

Outra fronteira abissal
Luzem distantes estrelas
Lá no cosmos sideral

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A ENTREGA E A POSSE

Com as pálpebras fechadas
Os corpos sentem o frêmito
Nas almas extasiadas

Um casal dorme unido
Em pleno ato desse amor
Um sorriso e um gemido

Densa fusão nuclear
Concupiscência e cio
Em possuir e doar

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DURANTE O ANTES E DEPOIS

Um mais um são mais que dois
São nomes e sons no antes
No durante e no depois

Aperto no coração
Uma saudade e um nome
Adeus e aceno de mão

Quintessência do cio
Dentro e fora da carne
O desejo por um fio

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O VAZIO NA PLENITUDE

No ar olores de incenso
Um templo abarrotado
Por dentro um vazio imenso

Orar sempre mais e mais
Em conexão com o além
Seres espirituais

Crer na fé e nos seus ritos
Em milagres ou malogros
De santos anjos e mitos


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OS HORMÔNIOS HARMÔNICOS

A dama passa um perfume
Escolhe a lingerie
E submissa se assume

Fervem tórridos hormônios
Tremem os nervos e músculos
Dilatam-se os neurônios

É um querer sempre mais
Em licenciosidades
E
volúpias carnais

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O FRIO DO AMOR E DO MÁRMORE

A silhueta devassa
Apieda-se de si
Ao ver a freira que passa

No mármore frio da sé
Ajoelha-se outro corpo
Tremendo em tanta fé

Sopra um alento do além
Espírito preso ao corpo
Muito aquém de um amém

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ODE COM FLORES DE PLÁSTICO

Os finados tem seu dia
Evoca um par de lágrimas
A velha fotografia

Nas falsas flores de plástico
Depositadas no túmulo
Um momento de adeus kármico

Brilha a funesta sorte
Esse hábito do óbito
Nefanda e nefasta morte

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LÍNGUA NA PONTA DA ÍNGUA

Encontro de hora marcada
Íngua na ponta da língua
E a pele nua afagada

Um coito no fim da tarde
No ato da consumação
Entre os atritos da carne

Na fissura mental
Frisson e frenesi lúbrico
Num ato transcedental

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PROCURA-SE ALGUÉM ÍMPAR

Na procura de seu par
Cada um leva no peito
Um vulcão a transbordar

E no magma digital
Encontro de alma gêmea
Cada um com seu igual

Vibra a imagem binária
Lucidez alucinógena
Na sina visionária

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OUTRO PRESENTE DO TEMPO

Bolo e velas sobre a mesa
Uns cartões de parabéns
E uma festa surpresa

Na folha do calendário
A volta ao redor do sol
No dia do aniversário

Como um abalo sísmico
Nesse cíclico viver
Sempre mutável e rítmico

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METAMORFOSE EM LETRAS

Letras formam a textura
De outra cosmogonia
Numa antiga escritura

Papiros de Alexandria
Um copista fecha os olhos
Amanhece mais um dia

Raro saber e a gnose
Conhecimento de eras
Em plena metamorfose

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NO AR O PÓ DAS PALAVRAS

O silêncio é partido
Soa o timbre de uma voz
Um verso é proferido

A palavra faz morada
Seja na mente ou na veia
Antes de ser recitada

Cantilena de cigana
Ou em reza de responso
O som da palavra emana

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PEGADAS DE PEREGRINO

Segue só o peregrino
Caminha no campo santo
Escrevendo seu destino

Cada um com sua cruz
Uns rastejam pela terra
Uns viajam anos-luz

Quase ficção científica
Longas viagens galácticas
Numa vivência onírica

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MÍMESE DE UMA ESTRELA

Numa atmosfera plúmbea
Faíscas inesperadas
Desassombram a penumbra

Alguém acende uma vela
Para clarear o escuro
Ou imitar uma estrela

Cálido universo etéreo
Dimensões superiores
Do mundo esotérico

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O METAL RELAMPEJANTE

Num metal de sorte mágica
Profecias seculares
Nessa lâmina metálica

Na pele o fio da espada
Um metal que toca o corpo
Na aura uma luz de prata

Numa arma o fio do gume
Sabres de prata e de laser
Afiam a luz do lume

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UNS ÁTOMOS DE CARBONO

Lago cor de erva-mate
O menino pesca um peixe
Que na água se debate

Manhã calma no ocidente
A terra gira em seu eixo
Nenhum novo incidente

Sob a luz do sol num átomo
Velocidade da luz
Que se dissipa num átimo


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CROMÁTICAS IMAGÉTICAS

Tons de cobre na cor pura
Mais lilás e violeta
Outro tom que se mistura

As tintas unem as cores
Num corpo que toma formas
De auroras e albores

Na tela de um artista
Ver o sentido da vida
Em linguagem realista

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UM NOME VOA NO LIMBO

Pela página sagrada
Promessas de salvação
E uma alma angustiada

Pergunta-se o fiel
Para onde irá seu nome
Se pro inferno ou pro céu

Crer na cósmica sentença
Ou atravessar a vida
Na fé sem deus e sem crença


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QUANTICAMENTE DIVINO

Momento de introspecção
Conectar-se ao celeste
Ou mera sublimação

O dedo encontra a tecla
Chega ao chip uma reza
Que se volta para Meca

Nova era em solstício
Na
metafísica quântica
Um céu de quartzo e silício

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PESCADORES PECADORES

Linha do meridiano
Desconhece o pescador
Um outro cotidiano

Entre arcanos e quasares
Um satélite assiste
As fronteiras e os mares

Via química da gênese
Astrolábios on-line
E um barqueiro sob o zênite

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UM SIM É MAIS QUE UM NÃO

A agulha aponta o norte
Entre ídolos de barro
E amuletos da sorte

Com a bíblia nas mãos
O pecador dividia-se
Entre um sim e muitos nãos

Alma e vida em xeque
Pela
igreja eletrônica
Uma salvação hi-tech

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NOVO DEVIR NO PANTÁCULO

No desenho do pantáculo
Rubras letras do devir
Palavras de um oráculo

Um demiurgo humano
Invoca um sinal sagrado
Fazendo um gesto profano

Paz no êxtase etéreo
Telúrica simbiose
Crer no divinal mistério

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OS PLANETAS ALINHADOS

Propícia sinastria
Fervilha a ovulação
Evolução em harmonia

Na nívea lua cheia
O suspirar de uma fêmea
E a noite se incendeia

A noite equinocial
Constelações siderais
E um sol zodiacal

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DOIS CORPOS E UMA MENTE

Entre choques neuronais
Fogem sinapses rebeldes
Dilúvios hormonais

Num ato incandescente
Dá-se um feérico encontro
Dois corpos e uma mente

Outro sonho repetido
No eletroencefalograma
Pesadelo e libido


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ENTRE EFLÚVIOS ONÍRICOS

Mira o olho na luneta
A geografia terrestre
Neste canto do planeta

Países imaginários
E nos mapas de satélites
Horizontes libertários

Sutil holograma gráfico
O mundo em miniatura
Num
efeito de olho-mágico

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CONTEMPORÂNEA MENTE

No instante de um momento
Um relógio parado
Não atrasará o tempo

O ontem foi momentâneo
Cabem séculos num disco
O já é contemporâneo

Na tela um óptico enigma
O milênio via vídeo
E seu novo paradigma

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ENTRE A PRESSA E A PRECE

Se uma prece não tem preço
Cabem as chaves do céu
No rosário ou no terço

O corpo inteiro suplica
Se a alma sobe ao alto
É aqui que o corpo fica

Na letargia dormente
Consciência e ciência
No lado esquerdo da mente

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ENTRE ÁRVORES E NAVES

O homem desceu da árvore
Construiu aeronaves
E catedrais de mármore

Outra nave ao céu subiu
E um macaco sequer sabe
Que ele não evoluiu

A ascensão meteórica
Das árvores ao espaço
Na jornada metafórica

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MILAGRE EM SOLITUDE

Um ente peregrinava
Entre solitude e pássaros
Num milagre acreditava

Soava o som de um sino
Versículos entre os dedos
Selaram mais um destino

Hoje em sussurros teclados
Acasos não determinam
Os perdões pelos pecados

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MÁGICA TRANSMUTAÇÃO

Extrair pólem das flores
Da uva fazer o vinho
Da tinta colher as cores

Em tirar ouro do chumbo
Labuta na faina o mago
Num sonho mudar o mundo

Na gótica utopia
Alquímica mutação
Luz do ouro na magia

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REPRODUÇÃO INDUZIDA

Nono mês n’água benta
Da proveta tantos genes
Querem sair da placenta

Mais que palavra profética
A evolução humana
No milagre da genética

Mundo mundano e moderno
Duplos ícones e clones
Desse homem hodierno

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AS PUPILAS DILATADAS

Sob todo o firmamento
Todo par que se encontra
Alimenta o sentimento

Nas pupilas dilatadas
A fúria de uma cópula
E ânsias saciadas

Flui o instinto animal
Permissividade mítica
Volúpia visceral

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PAZ E A MORTE SEMPRE

 

O tempo urge assim

Acabar com os relógios

O amor ruge carmim

 

E rasgar os calendários

Ao fogo com as agendas

E também com os diários

 

Ampulheta de marfim

Revela sempre um segredo

A morte surge no fim

 

 

 

 

.................................................... 5

 

DESPERDIDA: Conversas Com Uma Fotografia

 

I

Um romance chega ao fim
Momento de despedida
Hora de dizer adeus
Fica um pouco de você
Muito em mim vai embora
Até breve e até sempre
Que sejas muito feliz

Um corpo se distancia
Indo embora pra bem longe
Mas as letras do seu nome
Me ardem na ponta da língua
Néctar de raros perfumes
Levados na brisa do tempo
Trazidos no vento do agora

A lua na madrugada
Espiava nosso amor
Invejava nosso beijo
Calor na pele afagada
Toque sutil de ternura
E na líquida volúpia
Dois corpos estremeciam

Nos albores da aurora
Acordávamos juntinhos
Nossos olhos se abriam
Ao mesmo tempo também
A luz do sol descobria
Um casal que se amava
Na rosa branca do dia

 

II

Seu nome era uma linha
Na palma de minha mão
Invadiu as minhas veias
Jorrou a luz em meu sangue
Tatuou-se em minha alma
Impregnou-me sonho adentro
Granada dentro do peito

A retina iluminou-se
Luz na íris dos seus olhos
Cada linha do seu corpo
Cada traço do seu rosto
Na inefável silhueta
Em sinuosa escultura
Repousada nos lençóis

Num sussurro dos seus lábios
O som da palavra sim
Desde o primeiro instante
Um hálito de promessas
E a certeza de amar
As cores de nossa aura
Sabem disso muito bem

Voar e flanar no voo
Estar mais perto do sol
Quase tocar as estrelas
Sentir a brisa na bruma
E estar dentro da nuvem
Como estar em seus abraços
Arrepio na epiderme

 

III

Você era o dia de ouro
Manhã nívea no jardim
O que foi melancolia
Melodia veio a ser
A escrita mais cálida
Entre letras e entrelinhas
Em meu livro-coração

Você era raio e sol
Neste peito de iceberg
O sal no meu oceano
A brisa que sopra a vela
No barco do meu destino
Onda na beira da praia
E a espuma na areia

Você era raro linho
Tramado em fios de sonhos
Desenho de muitas flores
Bordado na tela nua
A agulha do desejo
Costurou os dois tecidos
Com linhas do sentimento

Mas mesmo a primavera
Deixa um dia o jardim
Uma borboleta azul
Embriagou-se no néctar
A mesma lua diáfana
Lembra na noite crescente
O olho de uma pantera

 

IV

A borboleta do amor
Voou numa tarde cinza
Para além do horizonte
E não ficou quase nada
Só umas fotografias
Numa pequena caixinha
Testemunham sua ausência

Mas nas asas da saudade
Na hora da solitude
Lembrarás de quem lhe amou
No sino que soa ao longe
O meu nome em seus ouvidos
E o timbre de minha voz
Quando alguém disser ‘te amo’

Seu corpo dirá do afeto
Tangido em nossa pele
Das tempestades solares
Que nos ferveram o sangue
Dos seus sonhos e segredos
Tão sonhados nestes braços
Num dilúvio em carícias

E a rosa da solidão
Se nascer em seu jardim
Se as pétalas da lembrança
Em olores de saudade
Perfumarem seu semblante
Com meu nome em seus lábios
Ainda vive esse amor




 

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