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Deus não é amor...

Fico impressionado com a incapacidade que algumas pessoas têm de encontrar Deus de uma forma saudável; acabam reféns do barulho, da gritaria, da bateria da igreja, das “palavras ritmadas” do pregador, enfim, do “ôba-ôba”. Uma coisa é certa: quem só sabe encontrar Deus na emoção, perde-o na razão do cotidiano – acabam se tornando cristãos superficiais e frágeis.
 
Foi num clima de emoção, de “ôba-ôba”, que certo pastor (ex-travesti, cujo testemunho é sucesso na internet) falou uma das maiores atrocidades que eu já ouvi na minha vida: “Homossexualismo é demônio”. A afirmação discriminatória se embrenhou biblicamente no episódio da criação, segundo o pastor “se homossexualidade fosse algo de Deus, Deus teria feito o homem, a mulher, e teria feito uma ‘bibinha’ junto”.
 
É interessante analisar certas incoerências dos seres humanos. Uma igreja pentecostal brasileira construiu um templo luxuosíssimo na cidade de Beira, Moçambique; lá os pastores da referida igreja resolveram distribuir camisinhas entre os habitantes da região, uma vez que as doenças sexualmente transmissíveis constituem um grave problema do continente africano.
 
Ora, faz parte da moral cristã que o sexo é uma experiência a ser vivida apenas após o casamento. Distribuir camisinhas a uma população pode ser entendido como um ato de incentivo ao sexo prematuro, irresponsável, e biblicamente imoral. Mas, para essa igreja pentecostal, “a igreja precisa estar concatenada com a realidade do mundo”.
 
Nesse caso, é fácil concluir a posição da igreja: vale a pena descumprir a ordem de Deus de “conservar o leito conjugal imaculado” (Hebreus 13,4) em nome de uma realidade social que ameaça a vida daquela população, e, além disso, a AIDS não foi algo expressamente abordada na bíblia.
 
Eu não sei por qual motivo esse pastor, também pentecostal, não consegue enxergar que na questão do homossexualismo a igreja também precisa estar concatenada com a realidade do mundo. E, além disso, a bíblia não trata expressamente dessa questão (portanto, quaisquer conclusões constituem um pretensioso “fundamentalismo bíblico”). Talvez pelo fato do homossexualismo sequer ter sido um fato socialmente discutido na época em que a Bíblia foi escrita, Deus acabou não tendo a oportunidade de inspirar aos seus humanos escritores a sua posição frente ao tema. Atrocidade maior foi afirmar que homossexualismo é um demônio, sem nenhuma base teológica ou bíblica (nesse caso, sequer fundamentalista). Ele não saberia dizer em qual livro, capítulo e versículo da Bíblia Sagrada, Deus fez tal afirmação.
 
E outra, o “testemunho forte” do pastor e ex-travesti contém uma série de aberrações. A primeira delas é supor que todo homossexual é travesti, e não é. Tenho vários amigos que são homossexuais – a vivência com eles pareada às minhas leituras acerca do assunto me permite assegurar que a maioria dos homossexuais aceita a sua natureza física. Isso porque numa relação entre dois homens ou duas mulheres, não se têm papeis. As pessoas criaram em suas mentes a ideia errônea de que um casal homossexual é uma “imitação” de um casal heterossexual, onde um faz o papel do homem, e o outro da mulher.
 
Outra questão importante em relação à homossexualidade é a prática da promiscuidade, que pode ser informalmente explicada como “um comportamento sexual humano, de sexo casual entre pessoas conhecidas ou não conhecidas entre si”. É bem verdade que essa prática está disseminada no homossexualismo, mas isso não significa dizer que ela é exclusiva dos homossexuais. Notamos a raiz da promiscuidade nas várias baladas frequentadas por jovens se orgulham por “pegar” cinco meninas numa mesma noite – quando um homossexual age assim é “safadeza”, quando um heterossexual age assim é “macheza”. O pior é ver que isso se tornou natural aos olhos da sociedade.
 
A verdade é que muitos paradigmas precisam ser quebrados. As pessoas precisam entender que caráter e sexualidade não tem nenhuma relação. A sexualidade de um indivíduo não influencia nos valores que ele possui ou não. Homossexualismo não é sinônimo de prostituição, por exemplo – essa prática independe da opção sexual (se é que sexualidade é uma opção).
 
Vejo muitos homossexuais lutando pelo direito de constituírem uma família – e não acredito que isso seja anormal quando a base de uma relação é o amor. No entanto, tem muita gente por ai falando bobagens. Esqueceram-se de pregar que o amor, desde a vinda de Cristo ao mundo, se tornou o maior de seus mandamentos.
 
Por favor, parem de inventar regras, acabem com o mau do fundamentalismo. Não podemos permitir que seja reinventado um novo Deus, que não admite que dois indivíduos se amem, independente do gênero. Ainda que homossexualismo fosse pecado, o Deus que eu conheço assegura que “o amor cobre a multidão de pecados” (I Pedro 4,8). As pessoas que se envolvem com esse discurso discriminatório parecem ter a mente vazia – e “mente vazia é oficina do diabo” – já dizia o jargão popular.
 
Por fim, vamos entender definitivamente que Deus é uma ação produtiva. Como seria bom que determinadas pessoas deixassem de “dançar Deus” e fosse ao mundo, na sua simplicidade e na sua rotina, fazer d’Ele um instrumento de justiça social. O amor que Deus representa é uma ação constante, afinal, Deus não é amor, Deus é amar.
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Arryson André ESCRITO POR Arryson André Escritor
Maceió - AL

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