Onde estão eles?

            Onde estão os teus velhinhos, de olhos vagos e cabelos em neve? Que sentavam à beira da janela ou no alpendre da casa e os pensamentos cavalgavam horizontes sem fim? Suas mãos calejadas, ásperas, seus rostos cansados, murchos, enrugados pelos anos... Onde estão eles? Aquele velhinho chato, ranzinza, que torcia para que tua bolinha caísse dentro do quintal dele para poder rasgá-la.

            Hoje, parece que ele se chama pelo teu nome. Outras crianças te odeiam, te maldizem, te ignoram... e ficas a espiar navios imaginários singrando um mar de nuvens esparsas no céu. Insistem em te dizer que aquilo são apenas nuvens, mas vês navios que nunca guiastes, observas mares nunca dantes navegados. Onde estão os teus velhinhos? Estão em ti mesmo.

            Onde estão os teus donos de bodega que te sonegavam um confeito, uma bala ou pirulito? Que faziam questão pelas malditas moedas de centavos que nunca tinhas. E ficavas com inveja dos filhos dos mais abastados que de ti não sentiam pena ao ver-te mendigar um doce. Onde estão eles? Os teus donos de bodega? Os filhos gordos, bonitos e abastados dos pais ricos? Pais ricos que enchiam os filhos ricos das balas mais gostosas, mais saborosas e mais ricas; dos chocolates que te deixavam com água na boca?  Dos pirulitos de morango, das balas de mel, dos confeitos de amendoim que para ti eram inacessíveis. Onde estão eles? Talvez ainda vivos; uns gordos e ricos, outros magros e pobres; talvez já tenham partido para um outro plano e tu ficaste para lembrar da tua infância de deserto, da tua infância de rapadura com água de quartinha em dias de feira livre.