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A Arrogante do Farol

 Quando Rômulo acertou o pagamento da pousada no Recife, Seu Manoel, o proprietário, pediu-lhe um favor, levar de carona a Maceió, Daniela, sua filha adolescente. Gentil, ele disse ser um prazer. Partiram após o almoço. A jovem acomodou-se a seu lado no banco da frente, não o cumprimentou. Tinha um “walk-man” grudado ao corpo e o fone no ouvido. Ouviu música durante a viagem numa pose de quem estava fazendo um favor em ter sua companhia.

Rômulo sentiu desconforto com o comportamento mal-agradecido da menina. Daniela, bem crescida, dizia ter 18 anos, entretanto, não completara 16. Corpo formado, formatado, cintura fina, quadris largos, a pele rosada destacava sob a blusa de malha branca. Bermuda jeans apertada, pernas grossas, bem torneadas. Uma bela menina pensou Rômulo enquanto analisava discretamente a companheira acidental.

A viagem transcorreu monótona, sem conversa, Daniela ouvindo rock. Em certo momento ela retirou o fone do ouvido, sem pedir licença, ligou o rádio do carro, procurou um rock pauleira, ficou a ouvir calada enquanto o carro rodava na estrada. Rômulo tentou conversar, desistiu diante do mutismo irritante de Daniela.

Com duas horas de viagem iniciou uma chuva grossa, persistente, há uma semana chovia na região. Rômulo parou num posto de combustível, abasteceu. Depois do lanche, pela primeira vez, Daniela falou com Rômulo:

- “Minha conta eu pago. Faço questão de não lhe dar despesas.”

Rômulo se assustou, já havia pagado, respondeu brincando:

- “Na próxima você paga”.

Retornou à estrada, mais 10 minutos sob intensa chuva, deparou-se com um engarrafamento na estrada, carros parados, trânsito lento. O aterro da cabeça de uma pequena ponte desmoronou devido à enxurrada da chuva, o D.E.R. podia liberar a estrada a qualquer momento, entretanto ninguém podia passar enfrentar a estrada àquela hora, escurecia, era perigoso. O policial aconselhou a dormir em Palmares, continuar viagem no outro dia.

Rômulo perguntou a opinião de Daniela. Simplesmente ela fez um gesto com os ombros e os beiços, como se dissesse tanto faz, ele precavido retornou ao posto. Recomendaram um hotel na cidade.

Na portaria Rômulo pediu dois quartos. A chuva continuava mais forte ainda, ele marcou com Daniela para jantar no próprio hotel às 19: 00h.

Rômulo desceu na hora combinada, Daniela já havia jantado, subia as escadas para seu quarto, sem sequer dar um boa-noite. Ele não entendia aquela grossura da menina, jantou, recolheu-se cedo, leu um pouco, custou a dormir.

No meio da noite foi despertado, fortes batidas na porta do quarto, a voz aflita de Daniela pedia desesperada: “Por favor, abra aqui. Abra aqui!” Rômulo deixou a cama num salto, abriu a porta, Daniela entrou enrolada no cobertor, deitou-se na cama, confessou com voz trêmula, morria de medo de chuva, raio e trovão. Rômulo surpreso, fascinado pelo encanto da mulher-menina, sentou-se à cabeceira, buscou confortá-la, alisou a cabeça, mandou-a dormir à vontade, ele iria para o sofá. Surpreendeu-se quando ela puxou-o pelo braço pedindo: “Vem para perto de mim cara!”

Levantou o lençol por um momento, estava inteiramente nua. Ele se achegou, abraçou-a, ao mesmo tempo em que a moça removia as peças que os separavam.

Noite fria, mudos intervalos de amor, não conversaram, apenas gemidos na hora do prazer. Louca ninfeta sabia tudo do amor, perfeita na hora certa, nada foi aprendido, sábia de nascença, uma Deusa.

Dia seguinte Rômulo acordou-se espreguiçando, Daniela deixou o perfume suave de alfazema. Olhou pela janela, o tempo havia melhorado. Tomou banho, fez a barba, arrumou a mala, desceu. Durante o café da manhã percebeu Daniela pronta sentada numa poltrona com a mala, esperando a partida.

Entraram no carro, Daniela tomou a mesma posição, calada como se nada tivesse acontecido, como se Rômulo fosse apenas motorista. Arrogante, cheia de soberba não sorriu sequer ao companheiro noturno de amor. Nariz empinado, fone no ouvido, não lhe dirigiu a palavra no resto da viagem, nem um “obrigado” quando ele deixou-a na casa de um tio no aprazível bairro do Farol.

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Carlito Lima ESCRITO POR Carlito Lima Escritor
Maceió - AL

Membro desde Abril de 2010

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Ron Perlim
Ron Perlim

Crônica não cansativa, cheia de surpresas, de violações. Aborda um tema complexo, delicado: conflitos de gerações e uma cumplicidade sexual.