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AS UNHAS DO SALDANHA

- “Depois de velho, você ficou relaxado, coisa feia! Unhas grandes, vou contratar manicure. Se eu morrer você vai virar um lobisomem”. Vivia reclamando Carminha nos ouvidos de Saldanha.

Certo sábado, pela manhã, a campanhia do apartamento tocou, uma morena sorridente se apresentou, Zefinha, manicure. Dona Carminha tirou o marido da leitura dos jornais, hora de fazer as unhas, ele levantou-se imediatamente, mais para se livrar de Carminha que por convicção. Saldanha sentou-se na poltrona, acionou o controle remoto da televisão, sequer olhou ou cumprimentou a manicure, colocou os pés numa bacia, água quente para amolecer as unhas. Dona Carminha deixou o marido entregue à manicure, foi às compras, sábado é dia de Shopping, encontro de amigas, só retornaria na hora do almoço.

Durante o cortar das unhas a mão de Zefinha alisava a de Saldanha com suavidade, ele sentiu uma sensação gostosa, carícia no toque de mãos, olhou para manicure com curiosidade, ficou excitadíssimo ao perceber o decote generoso da manicure, seios duros, empinados, teve vontade de abraçá-la, há muito não havia se excitado tanto com uma mulher. De repente, puxou conversa.

-“Menina você é uma boa manicure, sabe cortar com suavidade, onde você aprendeu a ser tão delicada?”

-“Eu precisava de uma profissão para ganhar dinheiro, sustentar minha filha, uma vizinha me ensinou, hoje tenho bons fregueses, não paro de cortar unhas, os clientes gostam. Não estudei, sou analfabeta, ser manicure é muito bom para mim. Ganho meu sustento”

-“E seu marido, pai de sua filha, não lhe ajuda?”

-“Ele me emprenhou menina, 16 anos, danou-se para o Rio de Janeiro, foi tentar ser cantor de rádio e televisão, canta bem, mais de cinco anos não tenho notícias dele, soube que é bandido, traficante. Por isso vivo com minha mãe.”

Conversaram muito, Zefinha contou sua vida severina, comum na periferia do Nordeste. Ao terminar, ele olhou os pés, as mãos, admirou as unhas simetricamente cortadas, perfeitas. Perguntou o preço do serviço, pagou R$ 25,00, cinco a mais do valor pedido. A morena agradeceu, guardou o material, Saldanha ficou perplexo ao perceber o corpo, o traseiro da morena dentro do vestido azul claro, quase transparente. Zefinha se despediu perguntando quando retornava. “Venha no outro sábado”, disse com entusiasmo admirando o rebolado da manicure em direção à porta.

Na hora do almoço Dona Carminha inspecionou as mãos, os pés do marido, aprovou, perguntou se havia gostado da manicure, Saldanha resmungou um “rã”, se fez indiferente, entretanto, a moça não saía da cabeça.

Foram dois meses se alimentando de fantasia, sonhava com a morena acariciando seus pés. Ficava feliz na sexta-feira anterior ao sábado da visita da manicure. Tornaram-se amigos de conversas, ela confessou ter sido menina de programa, não gostou. Saldanha se encorajou numa manhã cheia de sol ao pagar a manicure alisou o pescoço, o colo, deu-lhe um beijo na testa. Ela baixinho fazia reclamar, “não Seu Saldanha, não...” Ele a trouxe num abraço apertado, beijou-lhe a boca. No apartamento da Ponta Verde, à carícia do vento Nordeste, em cima do tapete comprado na Capadócia fizeram amor pela primeira vez.

Dona Carminha ao chegar notou a cara de felicidade do marido tomando uma cervejinha, cantando na varanda, achando o mar e a vida bonita. Convidou a mulher para almoçar, variar de comida, de tempero, foram ao Restaurante do Zezé, encontraram amigos passaram uma tarde maravilhosa conversando, uísque de combustível, à noite se amaram como nunca mais tinham amado. Dona Carminha, antes de adormecer, conseguiu perguntar, “o que deu em você?”

Saldanha discreto e criterioso, estabeleceu norma com a manicure, em casa nunca mais, encontra-se com a amiga toda quarta-feira, tarde de amor e ajutório, se sente mais jovem, cabelo cortado, camisa da moda. Nunca mais Dona Carminha reclamou as unhas do marido.

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Carlito Lima ESCRITO POR Carlito Lima Escritor
Maceió - AL

Membro desde Abril de 2010

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