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O tempo e espaço do filme A Rosa Púrpura do Cairo, uma análise para Fundamentos em Cinema*

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Cristian Metz em seu texto A Significação do Cinema declara que “de todos os problemas de teoria do filme, um dos mais importantes é o da impressão da realidade vivida pelo espectador diante do filme” (p.15).

 

Ele não está errado. O que propõem as câmeras nada mais é do que dialogar as informações representativas como construções reprodutivas e simbólicas. Arlindo Machado comunica este fenômeno em seu livro Ilusão Espetacular e revela que “as câmeras são aparelhos que constroem as suas próprias configurações simbólicas, de outra forma bem diferenciada dos objetos e seres que povoam o mundo; mais exatamente, eles fabricam simulacros, figuras autônomas que significam as coisas mais que as reproduzem” (p.11).

 

Daí partiu a criação de Woody Allen, em A Rosa Púrpura do Cairo, simular os graus de importância das imagens no cinema: representantes x representados, significantes x significados, cinema/ficção x mundo/realidade, e por ai vão as contradições do imaginário promovidas pela linguagem e narrativa cinematográfica.

 

O grande jogo de seu roteiro, muitíssimo premiado em 1986, não foi dado ao contexto histórico com o qual se situava a obra durante os anos da Grande Depressão nos Estados Unidos, muito menos na abordagem simples com que Cecilia, como garçonete sofria desgastes em seu casamento por conta de um desatento marido, desempregado e grosseiro, mas da forma como se refugiava no encantamento diante da tela do cinema. Foi o modo com que a narrativa transpôs do significante ao significado, transportando a protagonista para dentro de tela de cinema do filme em que costumava diariamente ver. A narrativa se apropriou do uso da metalinguagem, no qual Woody Allen fez com muita propriedade: o cinema falando do cinema, espectador se tornando personagem, processo no qual materializou o que muitos ali, como espectadores, gostariam de viver.

 

É o que revela logo no início do filme em plano subjetivo quando as imagens simulam o que os olhos da personagem vê, contextualizando no espaço, em planos conjuntos e médios em um direcionamento a planos aproximados e closes do que desejava, aproveitando p mostrar aspectos característicos de sua personalidade, de mulher desatenta e sonhadora.

 

Em todo o tempo os ângulos são fundamentados com tomadas objetivas, em ângulos de visão neutros, criando ao mesmo tempo uma aproximação ao que era visto pela personagem e ao mesmo tempo criando uma metáfora entre os diálogos e processos narrativos de efeitos especiais. 

 

O tempo e espaço foram importantíssimo neste processo. Os cenários foram poucos, uma vez que na obra era o tempo o de mais importância. Isto fica muito claro no momento em que o ator sai da tela indo em direção a Cecília e eles fogem para fora da sala de cinema.

 

São poucos os cenários em que Cecília perambula: a sala de sua casa, a sala de cinema, ruas próximas ao Cinema, lugar de trabalho e parque de diversão.Os ângulos sempre remetem às mesmas cenas que vão se modificando apenas com expressões e olhares interpretados por Cecília.

 

Woody Allen transgrediu se apropriando exatamente ao que os recursos cinematográficos propõem, gerando narrativas com jogos de sequenciais de planos de imagem, produzindo ao que Roland Barthes comenta sobre a “Retórica da Imagem” onde se pergunta de “qual a natureza que a impressão de realidade é produzida” (p.18). Onde ele procura explicação no aspecto do objeto percebido ou no aspecto da percepção, carregando indícios de realidade. Neste processo , ele aponta uma constante de interação entre os fatores afetivos e perceptivos, além é claro, da constante movimento, que consolida a impressão da realidade (p.19).

 

Ao longo de muitas apropriações feitas pelo diretor e roteirista, excluindo-se de ter sua participação como ator neste filme, como costuma ser em outras de suas produções, esta obra se enquadra no que Cesare L. Musatti chamou de “Efeito Estereocinético”, com o qual o movimento se indicia com realidades suplementares e corporalidades dos objetos imagéticos tão realisticamente representados na obra. Neste trabalho, Allen contempla e concentra a importância do espaço e tempo diegéticos convencendo-nos aos efeitos incomensuráveis de transgressão invisível do mundo ficcional que estes universos oferecem, e, de forma intransponível, apresenta elementos narrativos catalíticos por meio exclusivamente do cinema.

 

Referências Bibliográficas

 

METZChristian. A respeito da impressão de realidade no cinema. In: Metz,Christian. significação no cinema. São Paulo: Perspectiva, 2006, p. 15-28.

BENJAMIN, Walter. A obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica, primeira versão. In: Benjamin, Walter. Obras Escolhidas. Magia

e Técnica, Arte e Política. Ensaios sobre literatura e história da cultura. São Paulo: Brasiliense, 1985, p. 165-196.

MACHADO, Arlindo. A ilusão espetacular. São Paulo:Brasiliense, 1984.

 

 

* Trabalho acadêmico construído no 1º bimestre, ao longo da disciplina Fundamentos em Cinema, ministrado pelo Professor Ph.D. em Cinema e Literatura, Almir Guilhermino da Silva, pela UFAL.

 

 

 

 

 

Lola

Elenco principal

  • Mia Farrow .... Cecilia
  • Jeff Daniels .... Tom Baxter / Gil Shepherd
  • Danny Aiello .... Monk
  • Irving Metzman .... administrador do cinema
  • Stephanie Farrow .... irmã de Cecilia
  • Edward Herrmann .... Henry
  • John Wood .... Jason
  • Deborah Rush .... Rita
  • Van Johnson .... Larry
  • Zoe Caldwell .... condessa
  • Eugene J. Anthony (Arturo
  • Karen Akers .... Kitty Haynes
  • Annie Joe Edwards .... Delilah
  • Milo O'Shea .... padre Donnelly

[editar]Prêmios e indicações

Oscar 1986 (EUA) -Recebeu uma indicação na categoria de melhor roteiro original.

Globo de Ouro 1986 (EUA)-1)Venceu na categoria de melhor roteiro.- 2)Indicado nas categorias de melhor filme - comédia/musical, melhor atriz - comédia/musical (Mia Farrow) e melhor ator - comédia/musical (Jeff Daniels).

BAFTA 1986 (Reino Unido)- 1)Venceu na categoria de melhor filme e melhor roteiro original.-2)Indicado nas categorias de melhor atriz (Mia Farrow) e melhores efeitos especiais.

Festival de Cannes 1985 (França) -1)Ganhou o Prêmio FIPRESCI.

Prêmio César 1986 (França) -1) Venceu na categoria de melhor filme estrangeiro.

Prêmio Saturno 1986 (Academy of Science Fiction, Fantasy & Horror Films, EUA) -1) ndicado nas categorias de melhor atriz (Mia Farrow), melhor diretor (Woody Allen), melhor filme de fantasia e melhor roteiro.

Prêmio Bodil 1986 (Dinamarca) -1) Venceu na categoria de melhor filme não europeu.

 

 

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Lucciana Fonseca ESCRITO POR Lucciana Fonseca Escritora
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