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COM NEXO DESCONEXO - Tchello d’Barros

COM NEXO DESCONEXO
Tchello d’Barros


Classificar a humanidade em categorias opostas não é tarefa difícil, uma vez que as alternativas são muitas, para não dizer infinitas. É assim que nos dividimos entre ricos e pobres, belos e feios, cultos e ignaros, inteligentes e néscios, bons e maus e tantas outras bipolaridades que nos apontam os extremos da natureza humana. Tais contrastes podem ser observados também em diversos campos de nossa existência, desde os grandes feitos históricos até nas atividades triviais do cotidiano. É sobre essas circunstâncias que talvez essa página mereça algumas linhas, afinal de contas, existem duas categorias pouco comentadas: os conectados e os desconectados.

Quando meu avô era jovem, não havia telefone celular. Mesmo assim sei de um casal de namorados, apreciadores de poesia, que se reuniam num Café aos domingos, munidos de poemas de Martinho Bruning e deleitavam-se com a discussão sobre seus espirituosos haicais. Em contraste, hoje conheço um casal de namoradinhos, que quando ficam, têm o hábito de enviar mensagens escritas via celular. Uma dessas mensagens contava que já havia chegado a nova coleção de roupas de certa marca numa loja de Shopping Center.

Quando meu pai era jovem, não havia TV a cabo. Mesmo assim, sei de um grupo de amigos que naquela época encontrava-se e discutia sobre teatro. Era normal alguém analisar as diferenças estilísticas entre peças de Brecht com as de Shakespeare. Em contraponto, conheço uma turma atualmente, cujos temas nos diálogos giram em torno de peças de motores de carros esportivos e da anatomia glútea das participantes dos reality-shows, tudo devidamente apreciado na telinha da TV à cabo.

Quando eu era jovem, não havia Internet. Mesmo assim, lembro de amigos que sentiam verdadeira alegria em freqüentar exposições de arte, onde se discutia gêneros e gênios da pintura. Era comum alguém observar a influência do impressionista Monet, do surrealista Dali ou do pontilhista Seurat nas gerações que os sucederam. Em oposição, conheço um pessoal que pela Internet participa de conversas coletivas em seus chats, onde o tema não ultrapassa a descrição dos efeitos do último porre ou da sensação provocada pelo uso de algumas substâncias, digamos, proibidas.

Naturalmente que os exemplos aqui apresentados são contrastantes, são flashes das circunstâncias de dois cotidianos distintos onde muitos dos não-conectados de ontem, embora não tivessem as opções de hoje, discutiam literatura, teatro e artes. Talvez exatamente porque não tivessem muitas opções. Em contrapartida, muitos dos conectados de hoje, ainda que tenham ferramentas tecnológicas de comunicação e lazer, perdem-se num labirinto de trivialidades, talvez exatamente por terem acesso a tantas opções.

É claro que há que se fazer as devidas ressalvas e exceções. É importante denotar que ninguém aqui é contra nada, nem lojas, nem roupas, nem esportes, nem reality-shows, nem festas, nem crônicas. Viva o livre arbítrio! Nunca será demais dizer que a modernidade é bem-vinda, mas que não se perca o bom gosto. Que o progresso, em todos os sentidos é mais que bem-vindo, mas que venha acompanhado de evolução.


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