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"O MISTÉRIO DE BLÉM-BLÉM E OS FANTASMAS DE JARAGUÁ" - Cordel de Tchello d'Barros

"O MISTÉRIO DE BLÉM-BLÉM E OS FANTASMAS DE JARAGUÁ"

Tchello d'Barros

 

 

Certa noite a lua cheia

Estava avermelhada

E depois da meia-noite

Nem sino nem badalada

Não se ouvia nem silêncio

Nessa noite tão calada

 

Isso foi em Maceió

Num lugar bem conhecido

No bairro de Jaraguá

De estilo muito antigo

Foi ali que aconteceu

Este causo estremecido

 

Duas almas se encontraram

Eram eles escritores

Poeta Jorge sem medos

Mestre Graça sem temores

Vieram pela saudade

Da cidade e dos amores

 

Percorreram todo o bairro

Caminhando lado à lado

Nas ruas do Jaraguá

Este lugar tão falado

E pararam no coreto

Que estava abandonado

 

Eles ali leram versos

De estilo bem rimado

Como em muitos outros muros

Por onde tinham passado

Leram todos os poemas

Que alguém tinha pintado

 

Foi então que Mestre Graça

Ficou impressionado

Disse ao Poeta Jorge

Do silêncio calado

Pois antigamente o bairro

Era tão movimentado

 

Isso foi há muito tempo

Quando aqui tinha voltado

Este bairro portuário

Foi bastante assombrado

Com muitas almas penadas

E o povo assustado

 

Foi então que o poeta

Diante da situação

Acendeu mais uma estrela

Antes da explicação

E contou porque agora

Não tem mais assombração

 

Então contou de um doido

Que pelo bairro vivia

Ninguém sabe de onde veio

Seu nome ninguém sabia

Era um maluco alegre

Nem esmola ele pedia

 

Todos já lhe conheciam

Nunca aperreou ninguém

E tinha um apelido

Que ganhou não sei de quem

Por fazer muito barulho

Lhe chamavam de Blém-blém

 

Pois Blém-Blém batia ferro

Pela rua o dia inteiro

Batia em postes e placas

Com seu jeito costumeiro

Todos riam sem saber

Do motivo verdadeiro

 

É que os fantasmas do bairro

Ele podia enxergar

Tinha essa capacidade

Coisa de se admirar

Só que todos esses vultos

Ele queria expulsar

 

E disse à cada um deles

Pra dali se retirar

É que em seu querido bairro

Alma não ía morar

Porque a bela Maceió

Começou nesse lugar

 

Os danados aprontavam

Pela madrugada afora

Assustavam toda a gente

Que com medo ía embora

E os malvados só dormiam

Quando chegava a aurora

 

O Blém-blém disse que isso

Não ía mais permitir

E passou a bater ferro

Até o ferro retinir

Incomodando os fantasmas

Que não podiam dormir

 

Claro que eles não gostaram

Desse louco objetivo

Acordar o tempo todo

Ao som de ferro batido

Já tinha até sonâmbulo

Sonhando que estava vivo

 

Um por um foi indo embora

Não ficou nada daquilo

Alguns eram tão antigos

Que foram para um asilo

Foi assim que Jaraguá

Tornou-se um bairro tranqüilo

 

Neste ponto o Mestre Graça

Só por curiosidade

Quis saber mais dessas almas

Que por infelicidade

Tiveram que abandonar

Este canto da cidade

 

O poeta começou

A contar dessas pessoas

Disse que apesar dos sustos

Eram todas almas boas

Que vinham de muitos lados

Do estado de Alagoas

 

Na Rua Sá e Albuquerque

Tinha um fantasma brigão

Brigava com todo mundo

Dizia ser um barão

Mas foi só um cangaceiro

Do bando de Lampião

 

Esse veio dos Palmares

Um retinto escravo preto

Gostava de assombrar

Ali perto do coreto

Fugiu lá para o Farol

Hoje se esconde num beco

 

Um que era estivador

Há tempos sumiu do porto

De muito puxar açúcar

Tinha um jeito meio torto

De tanto que trabalhou

Nem viu que já estava morto

 

E uma quenga assombrada

Que assustava os pecadores

Fossem eles marinheiros

Peões ou estivadores

Essa foi para bem longe

Da vila dos pescadores

 

Um fantasminha da orla

Foi embora na maré

Atacava na igreja

Crentes que não tinham fé

E gostava de morder

Esse índio Caeté

 

Fugiu da Associação

Que chamam Comercial

Um fantasma holandês

Loiro e lindo sem igual

Habitava aquela estátua

Com jeito homossexual

 

Os fantasmas violeiros

Não zoavam com ninguém

Mesmo assim foram banidos

Por cantar no armazém

Dizem que agora assustam

Lá na estação do trem

 

Um fantasma que já foi

Catador de sururu

Sempre no Museu Chalita

Tocava o maior rebu

Foi expulso e hoje mora

Lá na praça Sinimbu

 

Outra alminha morava

Na Usina da Produção

Esse cantador de côco

Não escapou da expulsão

Foi visto recentemente

Lá no Museu Théo Brandão

 

Outro era um mandingueiro

Jagunço de um coronel

Mais um vaqueiro zarolho

Por causa do escarcéu

Fugiram bem rapidinho

Foram parar no Vergel

 

Foi então que Mestre Graça

Ao poeta perguntou

Do destino de Blém-blém

Que os fantasmas expulsou

Qual será seu paradeiro

Qual o fim que ele levou?

 

O poeta respondeu

Ouvindo ao longe o trem

Disse que ele cumpriu

Sua missão muito bem

E por isso foi chamado

Para um plano mais além

 

Neste fim de madrugada

Não havia mais ninguém

Ambos olharam pra lua

Depois disseram amém

Jaraguá hoje tem saudades

Dos barulhos de Blém-blém

 

 

 

 

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